domingo, abril 18, 2021

Cão que Ladra, Morde? Parte 2 – Campanha e Posse

A oportunidade aparentemente foi vista a partir das confusões pré-eleitorais em 2013. A intensa movimentação popular, potencializada por engajamento midiático até então nunca visto em tamanha intensidade, e pelo fenômeno capilar das redes sociais, foi habilmente captada e por setores com olho na eleição de 2014.

A utilização de símbolos nacionais em apelo pseudopatriótico, se não foi ação planejada pelo Partido Militar, foi rapidamente vinculada a ele. A bandeira nacional virou bandeira partidária, o amor à Pátria passou a ser monopólio militante.

 O primeiro ensaio foi a tentativa de despertar o apoio a uma intervenção militar. Não conseguiram uma massa crítica de entusiasmo necessário para o rolo compressor, as instituições não se engajaram na idéia, o próprio ambiente internacional retaliaria uma iniciativa disruptiva.

Pari passu foram desenvolvidas ações subversivas nos quartéis, nas tropas, nos corpos de alunos, incluindo a abertura de espaços e superexposição do candidato fantoche escolhido. Haveria necessidade de politização das armas, pois estas não poderiam obstar a tomada do poder em uma defesa do Estado Democrático de Direito sem que o plano fosse ameaçado.

Não bastaria a adesão dos escalões mais altos, a base também precisaria ser cooptada e doutrinada.
Era necessário vincular a imagem do capitão-candidato como identificada com o Exército, passar a borracha em seu passado maldito de insubordinação e terrorismo e associar-lhe à elite da corporação, íntimo dos comandantes, das tropas mais celebradas como sendo um deles.
O Exército sempre gostou de criar seus "heróis", suas categorias "mais valentes", num culto à personalidade diferenciada ainda que, ou exatamente para, destaque artificial, pois há 80 anos não há feitos de combate a celebrar.

Plano bem montado, né, um belo exercício de Estado Maior e resultado de alguma doutrinação na ESG.

O jogo político precisaria ser jogado pra platéia, ainda que com juízes ladrões e com VAR desligado.
Lançada a candidatura e, como comentado anteriormente, com um vice sendo um dos participantes do Alto Comando do Exército, como avalista do processo, a incapacidade do candidato era tão chocantemente evidente que rivalizava em chacota com o cabo-humorista Daciolo e seu bordão Glória... a Deux.

 O primeiro debate foi tão vergonhoso, tão humilhante, tão acachapante na mostra do desconhecimento, que deve ter feito corar até os mais entusiasmados. Haveria de se evitar repetir o vexame.

Para sorte da campanha, surgiu a polêmica facada em Juiz de Fora, com o condão de afastar o candidato do vexame público e desmoralização do projeto por um motivo inquestionável: proibição médica, liminarmente aceita pela comoção gerada pelo atentado e que, ao fim e ao cabo, garantiu a vitória nas urnas.

Ao mesmo tempo, o candidato geraria declarações que ocupassem os espaços de mídia e surpreendessem e desconcertassem as forças políticas tradicionais por sua bizarrice, non sense e agressividade.

Cumpriu bem o papel determinado e nesse contexto está a simulação de metralhamento de adversários com o pedestal de um microfone, as arminhas de dedos, a cooptação do fundamentalismo evangélico. A cada ação, mais mobilizava seu eleitorado e desviava a atenção dos militares em low profile.

O plano cumpriu a etapa com sucesso.

O Partido Militar tomou posse simbolicamente na pessoa de Bolsonaro e diretamente na do vice-presidente Mourão. Mais de 90% do então Alto Comando do Exército passou a ocupar cargos de relevância no governo, alguns dos generais ainda na ativa e a maioria com funções no Palácio do Planalto, em assessoramento direto do presidente.

É sempre importante lembrar que para oficiais na ativa assumirem funções civis necessitam autorização e concordância do comandante da Arma. Isso não seria difícil na medida em que houve dança de cadeiras, o novo ministro da Defesa não era outro do que aquele que assessorava (monitorava) o presidente do STF e o comandante do Exército era colega de turma do agora capitão-presidente-fantoche.

A área econômica, desinteressante e totalmente desconhecida pelo Partido Militar e de acordo com as projeções fantasiosas de desenvolvimento que lhes acenavam simplesmente foi delegada ao dito Mercado, ente abstrato que se confunde com os interesses de acumulação de recursos pelos detentores do Capital.

Diferentemente das gerações de oficiais pré-1970, essa nova abandonou qualquer ideário nacionalista e de autonomia nacional. Foi contaminada na origem pelo projeto neoliberal encabeçado por Thatcher e Reagan e que foi moda na década de 90 no Brasil, quando ocorreu a primeira grande onda de desnacionalização e privatização de bens e riquezas públicas.

Engabelados pelas fantasias do mercado, interesseiros e dinheristas, inundaram toda a administração federal garantindo bônus, honorários e gratificações a engordarem seus já polpudos rendimentos.

Nesse sentido reformas foram aprovadas retirando segurança laboral e previdenciária, garantindo, entretanto, e até ampliando a rede de proteção corporativa para os agora detentores do poder. Nesse particular, um governo em causa própria.

Farinha pouca, meu pirão primeiro seria um bom lema para esse governo militar.

E assim os desastres iniciaram desde os primeiros dias de governo.

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