Estado Mínimo X Estado Necessário - Parte 4 Contrastes e Desigualdades
Se é consistente a tese de que somente a Educação em caráter igualitário, meritocrático, público e universalizado pode promover a redução de contrastes individuais, nacionais e regionais, também é verdade que se compõe de ações que exigem esforço intenso, determinação e cujos resultados não surgem em curto prazo. O que fazer nesse tempo de maturação?
Redução da Miséria
A Constituição destaca como um dos fundamentos do Estado "IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa", dando-lhes valor equivalente e subordinando ambos aos valores sociais. Não sem outra motivação além de desconsiderar o trabalho como mero insumo na cadeia produtiva, Com efeito, a mão-de-obra é instrumento de produção, no trabalho há a dignidade ausente nos fatores de produção. No trabalho há um cidadão, protegido e razão de ser do próprio Estado. Poderia existir ainda que fosse outro regime econômico, mas a par da intrínseca dignidade humana a ser adita ao instituto trabalho, define também o regime econômico da livre iniciativa, a liberdade de empreender a par do trabalho, equivalendo e considerando o empreendedorismo também como uma forma de trabalho. Por isso ambos submetidos o interesse social. Não pode a livre iniciativa desconsiderar o valor social do trabalho; não pode o trabalho ser considerado exclusivo do trabalhador contratado.
Ambos, trabalho e livre iniciativa são meios de alcance do progresso social e desenvolvimento e ambos devem participar dos resultados do próprio trabalho. O do empreendedor, o do contratado. Não procede o trabalho desregulamentado, a bel prazer dos interesses, seja do empreendedor, seja do contratado. O fruto desse trabalho conjunto objetiva primordialmente a dignidade do cidadão. A justa remuneração é o instrumento de dignidade, não de potencialização das desigualdades. O compromisso social é o cimento de uma sociedade mais justa.
Até por essa razão, a sociedade deve buscar, por meio de políticas públicas, a situação de pleno emprego, não a manutenção de um estoque de desempregados como elemento de redução de custos. Pois o desempregado necessariamente será sustentado por todos, até por ele próprio. A intervenção do Estado como regulador é fundamental.
Inclusão de Segmentos
Todas politicas públicas devem passar pelo filtro da redução da marginalização de segmentos, sejam raciais, sejam sociais. Políticas de quotas são importantes para redução de contrastes em prazo curto e governos não podem se omitir nessa questão.
Acesso à Saúde
Tem que ser universalizado e público. Há que se buscar um modelo em que haja uma carreira pública de profissionais da saúde e que a medicina seja disponível nas pontas. Isso é possível, como mostra os serviços de saúde das Forças Armadas. A responsabilidade tripartite não pode servir de escudo à omissão e somente a forte intervenção estatal é capaz de tornar sistemas, como do SUS, a praticar também medicina preventiva. Volto a recordar que a livre iniciativa subordina-se a valores sociais, como enfatizado anteriormente.
Acesso à Justiça
Conflitos interpessoais precisam encontrar soluções ágeis e conciliatórias. Caminhou-se um tanto nessa direção, seja pelos Juizados de Pequenas Causas, seja pelas Defensorias Públicas.
Uma Justiça acessível e ágil é fonte de pacificação social.
Contrastes Regionais
A proliferação de megalópoles impacta diretamente na redução da qualidade de vida, no aumento da miséria, na indignidade cidadã. Também nesse tema o Estado deve intervir fortemente inibindo o crescimento tumoral e autofágico. As cidades incham em suas periferias com uma população em miséria em busca de algum meio de sobrevivência e de serviços públicos, em vista de uma possível oferta maior de ocupação. Esse inchaço é a semente da violência desmedida pelo contraste de meios e oportunidades. Políticas públicas devem buscar meios de incentivar a desconcentração de atividades econômicas nessas grandes cidades até o ponto de proibir novas instalações e incentivando seu deslocamento para cidades menores.
Esses mesmos princípios devem ser aplicados como instrumento de desigualdades regionais.
Segurança
Nesse tópico há que se distinguir a segurança pública como proteção do indivíduo e seu patrimônio da segurança também pública, mas como proteção da sociedade e seu patrimônio material e imaterial.
A primeira é instrumento de Justiça e assim deve ser vista.
A segunda, de preservação do próprio Estado como instituição nacional.
Ambas estão, entretanto, a serviço da sociedade civil politicamente organizada e por delegação dela. Nunca o contrário.
Previdência e Rede de Proteção Social
A fome é uma indignidade. A miséria traz a fome, a falta de abrigo, a precarização da vida.
A miséria é inconstitucional. é uma quebra de pacto, é indigna. E um dos principios fundamentais é a promoção da dignidade.
A infância e a velhice, ambas fora do intervalo produtivo, devem ser amparadas pelo Estado. Contribuições previdenciárias não podem ser tratadas como fundo atuarial, mas somente como uma fonte complementar de recursos para que o Estado cumpra sua obrigação de promover a cidadania.
Previdência e Proteção Social são destinações orçamentárias, não lhes cabe o conceito de deficit ou superavit individualizados. São serviços públicos em sua essência e assim devem ser considerados, não vinculados a fontes dedicadas.
Partindo desse princípio e independente de contribuições individuais, somente fontes complementares, o Estado tem por obrigação, a partir do montante possível para as contas públicas, estabelecer no orçamento a pensão mínima e a máxima a ser destinada, não podendo a mínima ser inferior a um salário mínimo e a máxima não superior a 10, pouco importando sobre qual montante individual houve de contribuição, pouco importando se trata-se de função pública ou privada, se privada, autônoma ou trabalhista. A proporcionalidade deve levar em conta as contribuições, mas os limites tem que ser universais.
Democratização Tributária.
O dado mais recente indica que 1% da população concentra 30% da renda e que 10% concentra 50% dela. É uma concentração escandalosa e que necessariamente leva a um equilíbrio instável e desorganização social. Além disso, essa concentração se perpetua pela transmissão em heranças.
Algo tem que ser feito.
O recurso acumulado concentra, o dispendido distribui. O recurso acumulado perpetua os contrastes, o não acumulado movimenta a economia. A renda do trabalho deve ser privilegiada em relação aos ganhos de capital.
Todo empenho deve ser feito para que o recurso acumulado seja taxado intensa e progressivamente, tal como a concentração de renda e heranças, até como um incentivo ao consumo.
O consumo, incluindo os insumos de produção, devem ser regressivamente taxados à medida de sua importância e essencialidade. O importante é que o indivíduo usufrua de seus recursos, não que os acumule excessivamente.
A democratização tributária, além de reduzir os custos entrópicos da estrutura arrecadadora, é instrumento eficaz para a redução dos contrastes extremos.
Esse conjunto de idéias, alinhavado reconhecidamente de forma superficial e genérica, ainda assim resume o que considero ser o Estado necessário.
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