Desbragadamente Mente
Os antigos falavam que não existe sábado sem chuva, domingo sem missa e segunda sem preguiça, embora a menção ao sábado seja muito pessimista. Mas eu acrescento, nem 31 de março sem uma mensagem historicamente incorreta, politicamente inconveniente, intelectualmente delinquente. Independente do dia da semana.
Não seria o ano de 2022 uma exceção. Ainda mais que os atores, se não são mais os mesmos, são alunos, filhos, genros ou somente fãs dos então protagonistas. Consideram-se herdeiros.
Pois bem, a Ordem do Dia (inteiro teor no final) publicada pelo Ministro da Defesa e, como toda Ordem do Dia, absolutamente toda a tropa deve dela tomar conhecimento, não fugiu à regra nos atributos. Apenas exagerou na mentira, não devia.
Destaquei alguns trechos (em preto), que comento em vermelho.
O Movimento de 31 de março de 1964 é um marco histórico da
evolução política brasileira, pois refletiu os anseios e as aspirações da
população da época.
Não é verdade, nem sequer há qualquer base para a afirmação. Se tivesse se contido em uma parte da população da época ainda seria beneficiado pelo indefinido.
Em poucos meses haveria eleições, o grande receio é que seus candidatos não fossem referendados nas urnas, o que já sinaliza que os tais anseios e aspirações seriam de uma minoria.
Na realidade, o golpe de 1964, completando a obra do de 1961 e de 1955, teve um objetivo fundamental: impedir as eleições.
Para tanto, seu primeiro ato, o AI1, simplesmente afirma que a revolução legitima-se a si mesmo e todos os atos derivarão desse poder instituído.
E isso não é golpe? É um marco de evolução? Ou retrocesso?
Em março de
1964, (as famílias, as
igrejas, os empresários, os políticos, a imprensa, a Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB),)
as Forças Armadas e a sociedade em geral
aliaram-se, reagiram e mobilizaram-se nas ruas, para restabelecer a ordem e
para impedir que um regime totalitário fosse implantado no Brasil, por grupos que propagavam promessas
falaciosas, que, depois, fracassou em várias partes do mundo.
Simplesmente o que houve foi a quebra da democracia e indução prévia da desordem para justificar o restabelecimento da ordem. Mais ou menos o que repetem agora com Bolsonaro, promovem a desordem com seu fantoche para assumirem a posição de limitadores e barreiras à bagunça.
E a que regime totalitário se referem? Jango, o maior pecuarista do Brasil naquele tempo, seria comunista? Quem teria o poder para isso?
Na realidade, a pretexto de evitar um regime totalitário, os golpistas deram o golpe e o implantaram. Durou 21 anos. Já acabou há trinta, mas continuam cultivando uma viuvez arrogante e supremacista.
Tudo isso pode ser
comprovado pelos registros dos principais veículos de comunicação do período.
Mais uma falácia. Sim, é verdade que os barões da mídia naqueles tempos, essencialmente jornais e rádios eram radicalmente contrários a conquistas sociais. Não é muito diferente de hoje, como também o eram os da FIESP, os mesmos que compraram da traição do general comandante do II Exército, Amaury Kruel, com duas malas recheadas de dólares.
Também é verdade que havia empresários antigolpistas na mídia. Esses foram fechados, empastelados, seus diretores presos. A Última Hora, por exemplo.
E continuou, a censura correu a rédea solta em jornais, livros, músicas. Jornalistas foram presos, alguns assassinados sob tortura, como Herzog. Políticos foram perseguidos e alguns mortos, como Rubens Paiva, cujo corpo nunca apareceu, assassinado por ter ajudado à filha de um amigo a fugir da ditadura e do Brasil.
Nos anos
seguintes ao dia 31 de março de 1964, a sociedade brasileira conduziu um
período de estabilização, de segurança, de crescimento econômico e de
amadurecimento político
Nos anos seguintes, 21 deles, houve perseguição, morte, tortura e medo a quem ousasse se opor à opressão e ditadura.
É verdade que após o primeiro governo com viés claramente entreguista e cuja economia era conduzida pelo avô do atual presidente do Banco Central, americanófilo de carteirinha a ponto de ser conhecido como Bob Fields, os governos subsequentes adotaram uma pauta de intervenção estatal na economia e em eixos estratégicos de desenvolvimento, muito mais próximos, nesse particular, do comunismo que dizem combater do que as próprias pautas do jango, deposto por eles para "impedir regimes totalitários".
O fato é que não sabiam, como ainda não sabem, distinguir lé de cré. Nenhuma carreira patrocina tantos cursos, mas militarismo e democracia são conceitos incompatíveis entre si. Sempre um haverá de se subordinar ao outro. Infelizmente para nós, temos um histórico de inversão de valores e a democracia quase sempre é violada.
Cinquenta e
oito anos passados, cabe-nos reconhecer o papel desempenhado por civis e por
militares, que nos deixaram um legado de paz, de liberdade e de democracia,
valores estes inegociáveis
Aqui reside o maior conflito do Sr Braga Netto. Afirma que a paz, liberdade e democracia são valores inegociáveis. No que eu concordo.
Porém, fosse coerente com o discurso, teria participado de atos antidemocráticos patrocinados por seu Chefe? De pregações de golpe? De ameaças a outros Poderes da República?
Como assim? Não era Chefe da Casa Civil? Não participava da copa e cozinha do governo?
Aí erra feio o Sr Braga Netto ao mentir para a tropa, naturalmente com menos anticorpos à mentida do que a sociedade civil. Afinal eles são condicionados a acreditar nos seus Chefes. E O Sr Braga Netto era o Chefe de todos, acima dele somente o Presidente.
Por isso, até entendo que o Sr Braga Netto minta como político, o que foi desde os tempos em que estava na ativa.
Mas não que minta como Comandante.
Inteiro teor da Ordem do Dia em https://www.gov.br/defesa/pt-br/centrais-de-conteudo/noticias/ordem-do-dia-alusiva-ao-dia-31-de-marco-1
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